Sunday, January 21, 2007

O Custo de Proteção de Conteúdo do Windows Vista

Em meados de janeiro de 2007, Peter Gutmann, um especialista neo-zelandês em segurança, lançou um artigo público sobre o custo agregado das iniciativas de suporte ao DRM (Digital Rights Management, ou Gerenciamento de Direitos Digitais) implantados no Windows Vista, a mais nova versão do sistema operacional da Microsoft. Tenho acompanhado as repercussões do artigo, e também outras publicações que falam dos extremos que a Microsoft trilhou para proteger os direitos dos provedores de conteúdo, notadamente de Hollywood com suas produções milionárias. Segue um breve histórico das desavenças dos provedores de conteúdo multimídia com as inovações tecnológicas.

Décadas de 70/80 - Com o lançamento da fita cassete, todo mundo podia gravar seus discos em fita e compartilhar com seus amigos. As gravadoras chiaram, mas seus lucros continuaram crescendo.

Décadas de 80/90 - Na era do videocassete e das fitas VHS, foi a indústria de filmes que anunciou sua eventual ruína, porém eles sobreviveram e fizeram filmes cada vez mais caros. No final dos anos 80 e início dos anos 90 a música digital passou a dominar o mercado com o lançamento do CD. Em meados dos anos 90, o formato MP3 e o lançamento de protocolos de compartilhamento de arquivos (o pioneiro sendo o Napster) botou a indústria em polvorosa. Ah, os lucros continuaram na ascendente...

Décadas de 90/2000 - Aprendendo com o caso do CD, o lançamento dos filmes digitais em DVD veio cercado por uma tecnologia de criptografia que impediria a pirataria, mas, para grande decepção dos provedores de conteúdo, a criptografia era fraca e pôde ser quebrada em pouquíssimo tempo. Mesmo que ela não tivesse sido quebrada, haveria a possibilidade de capturar as telas de exibição do filme e gerar cópias digitais sem as restrições da criptografia. O problema se agravou para a indústria quando as conexões de banda larga passaram a crescer e o protocolo de compartilhamento BitTorrent foi lançado. A primeira reação contra a quebra da criptografia no DVD veio na forma de legislação em 1998 com o DMCA (Digital Millenium Copyright Act, ou Ato de Copyright do Milênio Digital), um fruto do lobby de Hollywood no congresso americano. Por esta legislação, ficou ilegal a quebra de proteções anti-cópia, mesmo que para uso próprio. Vale salientar que o rip de CDs para MP3 continuou legal, pois não há quebra de criptografia no processo.

Década de 2000 - A novidade na área de filmes são o conteúdo de alta definição, representado pelas mídias em formato HD-DVD e Blu-Ray. A grande novidade destas mídias é o uso de criptografia forte não só na mídia de distribuição, mas em todos os caminhos entre a mídia e o monitor de exibição do conteúdo. Teoricamente o acesso ao conteúdo digital criptografado só é possível se todas as peças de hardware entre a mídia e o monitor souberem estabelecer uma conexão criptografada entre cada par de dispositivos. Para entender melhor o problema, é preciso ler o artigo completo, mas segue um resumo dos principais tópicos considerados na avaliação do custo adicional para a indústria de computadores, portanto, para o consumidor final, ao migrar para o Windows Vista:

  • O Windows vista só permite o tráfego de conteúdo protegido por dispositivos que sejam também protegidos. Assim, se você comprar um HD-DVD Player, mas não tiver uma placa de vídeo que entenda HDCP (o protocolo de criptografia do conteúdo de alta-definição), você não conseguirá ver o vídeo, ou então terá a qualidade do sinal deliberadamente embaçada (pelo próprio Windows ou pela placa de vídeo) para evitar que uma cópia do conteúdo seja feita com qualidade. O mesmo acontece com o áudio. E mais, se você assistir a um conteúdo de alta definição ao mesmo tempo em que navega na internet e ouve um CD, todos os aplicativos ficarão com a mesma perda de qualidade mesmo que não sejam de alta definição.

  • Para evitar a criação de drivers virtuais que tentem levar o windows a alimentar conteúdo de alta definição descriptografado para eles, o Windows exige que certos detalhes de identificação do hardware sejam mantidos em sigilo pelo fabricante. Esta restrição de informações dificulta ou mesmo inviabiliza a criação de drivers de fonte aberta para o uso deste hardware em sistemas operacionais abertos como o Linux.

  • Embora haja muitos fabricantes de placas de vídeo e de som, o número de fabricantes dos principais chips empregados nesses dispositivos, chamados de chipset, é bem menor. Assim, quando não se tinha o driver para uma determinada placa, era possível ir no site do fabricante do chipset e baixar um driver genérico que funcionava bem para quase qualquer dispositivo que usasse aquele chipset. Com o Windows Vista, cada dispositivo de hardware precisa ser univocamente detectado e, para abrir uma conexão criptografada com o Windows, precisa possuir uma chave que é adquirida junto à entidade global que controla a liberação destas chaves. Existe uma licença anual que precisa ser paga pelo fabricante para manter o registro das chaves. Em caso de falência, ou inadimplência do fabricante, a chave usada pelo hardware poderá ser revogada e esta informação estará presente nas novas mídias de alta definição produzidas, que não funcionariam mais no hardware revogado. A revogação pode ainda ocorrer se a Microsoft considerar que a segurança do dispositivo não for forte o suficiente, nesta condição, a empresa deverá obrigatoriamente lançar um driver atualizado sob pena de ter a chave de seu hardware listado entre as listas de chaves revogadas.


Bom, estes são os principais pontos abordados pelo artigo, mas existem diversos outros para quem tiver a paciência de ler o artigo na íntegra. O fato é que a Microsoft está levando muito a sério esta questão de proteção dos direitos dos provedores de conteúdo e está usando seu monopólio nos sistemas operacionais para forçar os fabricantes de hardware a seguirem a direção imposta por eles. O uso de criptografia forte em toda etapa do caminho se reflete em custos ao longo do caminho. Os processadores (do micro e da placa de vídeo) vão gastar tempo criptografando e descriptografando os dados, verificações de segurança ocorrem cerca de 30 vezes por segundo neste processo e conexões com criptografia precisam ser estabelecidas a cada etapa de trânsito dos dados de alta definição pelo sistema. Em última instância, quem está pagando por tudo isso é o consumidor que precisará trocar o seu hardware atual para um que entenda HD (alta definição), arcar com os custos de hardwares mais caros visto que os processadores envolvidos precisarão ser mais poderosos para poderem fazer o que já faziam anteriormente além dos ciclos de criptografia/descriptografia ao longo do caminho. Tudo isso somado ao risco do fabricante de seu hardware tiver problemas financeiros ou de segurança que o leve a ter suas chaves de criptografia revogados pela entidade de controle.

Por estes motivos, é necessário pensar duas vezes antes de migrar para o Windows Vista e para as tecnologias de alta definição. Convém esperar um pouco uma vez que as regras gerais de interoperabilidade e controle das listas de chaves revogadas não está plenamente funcional. Eu certamente vou ficar com o velho Windows XP por mais um tempinho. Se o dinheiro permitir, talvez meu próximo PC seja um Apple...

1 comment:

  1. [...] Após o lançamento do Windows Vista pela Microsoft, que inseriu no núcleo do novo sistema operacional uma série de restrições de flexibilidade de uso ao trabalhar com conteúdo protegido por direitos autorais, observa-se uma reação importante por parte da comunidade dos desenvolvedores do Linux com a criação do The Linux Foundation (TLF). Esta fundação tem por objetivo promover o crescimento deste sistema operacional. [...]

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